Skip to main content

Poluição da água: um problema urgente, mas reversível

A água, elemento essencial para a existência humana, tem sido alvo constante de ameaças invisíveis, mas extremamente perigosas. Os impactos da poluição sobre os corpos hídricos se tornam cada vez mais evidentes – e alarmantes. Substâncias químicas que usamos no nosso dia a dia, como medicamentos e agrotóxicos, estão alterando profundamente o equilíbrio dos ecossistemas aquáticos e, consequentemente, a saúde humana.

 Ansiolíticos para salmão: remédios que afetam a vida aquática

Estudos recentes mostram que os resíduos de medicamentos consumidos pela população estão chegando aos rios, com efeitos desastrosos sobre a fauna. Um exemplo surpreendente vem da Suécia, onde pesquisadores observaram que salmões estavam tendo dificuldades em migrar devido à presença de resíduos de medicamentos ansiolíticos nas águas. Os peixes expostos a esses compostos alteraram seu comportamento natural, comprometendo processos fundamentais para a manutenção da espécie (JORNAL DE BRASÍLIA, 2024).

O estudo conduzido por Brand et al. (2025) achou traços do medicamento clobazam (ansiolítico comum que tem poluído cursos d’água pelo mundo) e com isso pode-se verificar como esse ansiolítico altera a forma como o salmão selvagem do Atlântico migra. Os autores também descobriram como o clobazm alterou a forma como o salmão se movimentava em cardumes, eles estão criando cardumes menos compactos, em especial na presença de predadores, o que poderia aumentar os riscos que eles enfrentavam na natureza (ISTO É, 2025).

“Alterações no ritmo da migração podem fazer com que os peixes cheguem ao mar em condições abaixo do ideal ou aumentar sua exposição a predadores e outros perigos. Com o tempo, essas mudanças sutis podem alterar a dinâmica populacional e até mesmo perturbar o equilíbrio do ecossistema” (BRAND et al., 2025).

Esse tipo de contaminação não é exclusivo de países do hemisfério norte. No Brasil, o despejo inadequado de medicamentos e a ausência de tratamento eficiente nas estações de esgoto também contribuem para o acúmulo dessas substâncias nos rios. O ciclo da água, nesse cenário, transforma-se em um veículo para a disseminação de poluentes invisíveis e persistentes.

Cocaína na água do mar

Uma pesquisa realizada pela Universidade de São Paulo em 2024 revelou a presença de cocaína, cafeína e diversos medicamentos no mar do litoral de São Paulo. Entre as substâncias encontradas estão analgésicos, antidepressivos e até drogas de uso controlado, todas oriundas principalmente do descarte inadequado de esgoto doméstico e industrial (AGÊNCIA UNIVERSITÁRIA DE NOTÍCIAS, 2025). A descoberta reforça o alerta sobre a presença de contaminantes emergentes em ambientes costeiros, que muitas vezes não são completamente eliminados nos processos convencionais de tratamento de esgoto.

A pesquisa intitulada Produtos farmacêuticos e de higiene pessoal na zona costeira em Ubatuba (Brasil): um hotspot ecológico e turístico que enfrenta alta contaminação, conduzida por Luciana Rocha Frazão, do Instituto de Oceanografia (IO/USP), identificou os componentes desde a região litorânea até as áreas mais afastadas da costa, indicando uma extensa contaminação com baixo nível de diluição por toda a costa marinha.

“Luciana ressalta também as possíveis consequências desta contaminação, que podem afetar tanto a cadeia trófica, ou seja, a transferência de energia e, consequentemente, de poluentes entre os organismos, como também as trocas gasosas entre o oceano e a atmosfera” (AGÊNCIA UNIVERSITÁRIA DE NOTÍCIAS, 2025).

A presença constante dessas substâncias na água pode afetar a cadeia alimentar e comprometer a saúde dos ecossistemas. A situação é especialmente preocupante em regiões de grande densidade populacional e turística, como o litoral paulista, onde a pressão sobre os corpos hídricos é ainda maior. É preciso 

 Agrotóxicos na chuva

Outro dado preocupante é a presença de pesticidas nas chuvas que caem no estado de São Paulo. Uma pesquisa conduzida por cientistas da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar).

“Nas amostras coletadas, foram detectados 14 agrotóxicos e cinco compostos derivados, com destaque para o herbicida atrazina, presente em 100% das amostras, e o fungicida carbendazin, proibido no Brasil, mas ainda encontrado em 88% das amostras. Outros produtos também apareceram em concentrações alarmantes, e o herbicida tebuthiuron foi detectado pela primeira vez em água de chuva, em 75% das amostras” (UFSCar, 2025).

O Brasil é o maior consumidor de pesticidas do mundo, e o estado de São Paulo se destaca com 12%, sendo o segundo estado no ranking de aplicação de pesticidas do país (DIAS et al., 2025).

A pesquisa também relata que pesticidas como organoclorados (OCPs) foram detectados em regiões com alta densidade populacional, como por exemplo Rio de Janeiro e Santos. Guida et al. (2021) apud Dias et al. (2025) relatam que as concentrações de OCP representam um risco de câncer para as pessoas nessas regiões. 

Pesticidas também foram detectados em áreas rurais, mesmo em áreas que não utilizam pesticidas, sendo que OCP e outros pesticidas foram detectados em dois parques nacionais no sudeste do Brasil, mostrando que esses compostos podem ser transportados por longas distâncias (GUIDA et al., 2018 apud DIAS et al., 2025).

Os dados mostram que o problema não está concentrado apenas em área cultivadas, mas também no ar que respiramos e na água que bebemos. 

Há esperança: uma cidade que virou exemplo

Apesar desse cenário preocupante, há caminhos para a mudança – e eles já estão sendo trilhados. Cubatão, município que foi considerado pela ONU, nos anos 1980, a cidade mais poluída do mundo, hoje ostenta um selo verde internacional por suas ações de recuperação ambiental. 

“A poluição da água, do solo e do ar, junto à falta de legislação ambiental da época, causou inúmeros casos de mortes por doenças respiratórias e anencefalia - condição em que o cérebro e o crânio não se desenvolvem. O cenário mudou após um incêndio que matou 93 pessoas na Vila Socó, em 1984” (G1, 2025).

O município investiu em controle de emissões, recuperação de áreas degradadas e conscientização ambiental, revertendo décadas de descaso (G1, 2025).

A cidade recebeu o selo “Tree Cities Of The World” (Cidades de Áreas do Mundo) que são dados aos municípios que adotam práticas que valorizam o papel das árvores. 

 210 cidades de 24 países foram reconhecidas e receberam o selo ao redor do mundo, no Brasil foram 34 municípios. Cubatão é uma prova viva de que é possível transformar uma realidade crítica em um exemplo de sustentabilidade. A chave está em políticas públicas efetivas, investimentos em tecnologia e, principalmente, no engajamento da sociedade.

O papel do Instituto Água Sustentável

É nesse contexto que o Instituto Água Sustentável (IAS) atua: promovendo conhecimento, educação ambiental e mobilização para o uso consciente da água. Projetos como o Professor Água, que leva educação sobre água para crianças e adultos de forma lúdica, e o IAS Capacita, que treina produtores rurais em boas práticas agrícolas e uso eficiente da água, são exemplos concretos de iniciativas transformadoras.

Além disso, o IAS promove eventos como o Marlim Summit e o CarbonLess Summit, que colocam em pauta os desafios e soluções para a gestão costeira e o armazenamento de carbono, respectivamente. O IAS também se dedica à publicação de conteúdos acessíveis sobre águas subterrâneas e outros temas cruciais, ajudando a construir uma cultura de respeito ao meio ambiente.

Cada ação conta

Os problemas da poluição da água são sérios e urgentes, mas não são definitivos. O exemplo de Cubatão mostra que, com esforço coletivo, é possível reverter danos ambientais profundos. A atuação do Instituto Água Sustentável reforça essa mensagem: ao combinar ciência, educação e ação social, é possível fazer a diferença.

Se queremos garantir um futuro com água limpa e segura para todos, precisamos agir agora. O desafio é grande, mas a mudança começa com a conscientização – e cada um de nós pode ser parte dessa transformação.

Referências:

AGÊNCIA UNIVERSITÁRIA DE NOTÍCIAS. 2025. Pesquisa da USP descobre intensa concentração de poluentes em hotspots ecológicos de Ubatuba. Disponível em: https://aun.webhostusp.sti.usp.br/index.php/2024/10/22/pesquisa-da-usp-descobre-intensa-concentracao-de-poluentes-em-hotspots-ecologicos-de-ubatuba/#:~:text=A%20tese%20de%20doutorado%20Produtos,nas%20regiões%20costeiras%20de%20Ubatuba%2C

BRAND, J. A. et al. Pharmaceutical pollution influences river-to-sea migration in Atlantic salmon (Salmo salar). Science, vol. 388, issue 6743, 2025. Pp. 217-2022. Disponível em: https://www.science.org/doi/10.1126/science.adp7174

DIAS et al. Pesticides in rainwater: A two-year occurrence study in an unexplored environmental compartment in regions with different land use in the State of São Paulo – Brazil. Chemosphere, vol. 372, 2025. Disponível em: https://www.sciencedirect.com/science/article/abs/pii/S0045653525000335

G1 Santos. 2025. Cidade brasileira que já foi considerada a mais poluída do mundo pela ONU recebe selo verde internacional. Disponível em: https://g1.globo.com/sp/santos-regiao/noticia/2025/03/26/cidade-brasileira-que-ja-foi-considerada-a-mais-poluida-do-mundo-pela-onu-recebe-selo-verde-internacional.ghtml

Instituto Água Sustentável: https://aguasustentavel.org.br

ISTO É – DINHEIRO. 2025. Poluição da água com ansiolítico torna peixes mais destemidos. Disponível em: https://istoedinheiro.com.br/poluicao-da-agua-com-ansiolitico-torna-peixes-mais-destemidos/

JORNAL DE BRASÍLIA. 2024. Salmões têm dificuldade de migrar por poluição de remédios para ansiedade tomados por humanos. Disponível em: https://jornaldebrasilia.com.br/noticias/mundo/salmoes-tem-dificuldade-de-migrar-por-poluicao-de-remedios-para-ansiedade-tomados-por-humanos/

UFSCar. 2024. Pesquisa detecta agrotóxicos nas chuvas do estado de SP. Disponível em: https://www.ufscar.br/noticia?codigo=16465&id=pesquisa-detecta-agrotoxicos-nas-chuvas-do-estado-de-sp